O texto de Katharina Niemeyer, presente no livro “Nostalgias e mídia: no caleidoscópio do tempo”, de Luciana Santa Cruz e Thalita Ferraz, propõe uma reflexão sobre estudos e conceitos relacionados à nostalgia. A nostalgia pode ser descrita como um fenômeno, que migra para uma profunda estrutura emocional e psicológica, mas também para uma estrutura cultural, social, econômica e política. Hoje, mais do nunca, se fala e se estuda sobre nostalgia. Sua relevância está nos inúmeros estudos realizados pelos diversos campos do saber, que exploram suas potências, pluralidades, classificações e categorias. Historicamente, a nostalgia está ligada ao passado, à melancolia e à saudade. Uma lembrança de tempos e lugares que não existem mais, não são mais acessíveis ou talvez nunca foram.

Um sentimento reconhecido e expresso na Odisseia de Homero, a cunhagem do neologismo médico “nostalgia” para significar “saudade” apareceu pela primeira vez em sua tese de doutorado escrita por Johannes Hofer em 1688, na Suíça, e fazia referência a uma doença recorrente no exército. A etimologia grega do conceito, portanto, vem do nostos (para voltar para casa) e algia (saudade = anseio). Os doentes foram curados quando foram para casa, foram visitafos por membros de sua família ou ouviram música e histórias que evocaram imagens e memórias da pátria (NIEMEYER, 2018, p.35-36)
Porém, a autora ressalta que existe também o entendimento e, hoje, estudos, que comprovam também que a nostalgia abrange outras temporalidades, principalmente quando a entendemos como um desejo de um retorno de algo que nunca foi experimentado, ou de um futuro que nunca acontecerá. Niemeyer (2018) afirma que o sentimento nostálgico, além de abranger outras temporalidades, sem ser o passado, é frequentemente relacionado a imaginações utópicas sociais e políticas. A autora ainda afirma que a multiplicidade de reflexões sobre a nostalgia mostra a sua relevância e sua importância para as pesquisas acadêmicas, e que há muita coisa para ser escrita e estudada sobre o tema.

Conforme apresentado por Niemeyer (2018), os estudos são muito recentes. A autora realizado um retrospecto de alguns estudos e inicia sua exposição nos anos 2000, quando existe um olhar mais focado no chamado à repensar o lugar da nostalgia. Diversas áreas construíram para esses primeiros estudos, entre elas, os estudos culturais, a sociologia, a psicologia, antropologia, entre outros que buscaram entender a natureza mais construtiva da nostalgia, como forma de superar as crises pessoais do presente. Vem à tona também, termos como nostalgia individual e coletiva, mas também a transformação do substantivo em verbo: “nostalgizar”.
Até muito recentemente, a maior parte dos trabalhos acadêmicos em mídia e comunicação que abordavam a nostalgia, descrevia apenas suas formas estéticas ou narrativas, sem refletir em detalhes sobre sua ligação funcional com a nostalgia (NIEMEYER, 2018, p.32).
Essa ligação mencionada pela autora, foi feita com ênfase em um único meio, como por exemplo, a televisão, os videogames, a música, ou simplesmente da mídia em si. Em 2010, ocorreram estudos que estavam interessados em questões relacionadas aos meios de comunicação de massa, especialmente nos conteúdos e aspectos da produção de videogames e produções audiovisuais. E, mais recentemente, foi observado um interesse crescente de pesquisas nas áreas de mídia e comunicação pela nostalgia e outras coisas relacionadas a esse assunto como as culturas retrô e vintage. Este tipo de estudo se concentrou mais em áreas como cinema, televisão digital, indústrias culturais e midiáticas, culturas visuais ou cultura das mídias. Quando fala sobre a mídia e nostalgia mediada, Niemeyer (2018) afirma que a mídia oferece espaços e temporalidades para a “nostalgização”:
A mídia produz conteúdos e narrativas não apenas no estilo nostálgico, mas também como desencadeadores da nostalgia. A mídia e as novas tecnologias em particular podem funcionar como plataformas, locais de projeção e ferramentas para expressar a nostalgia. Além disso, a mídia é muitas vezes nostálgica por si mesma, seu próprio passado, suas estruturas e conteúdos. Mudanças de mídia perpétuas tornam a mídia nostálgica por seu fim inexistente ( NIEMEYER, 2014, p.7).

Sendo assim, a autora chama atenção para duas classificações: a nostalgia da mídia e a nostalgia mediada. A primeira faz referência à nostalgia que é expressa por textos da mídia, tecnologias e práticas da mídia, já a segunda, refere-se à comunicação explícita do sentimento. Niemeyer (2018) ainda chama a atenção para o fato de que a nostalgia não está simplesmente em todo lugar, sendo assim, devemos nos atentar ao tipo de nostalgia do qual estamos falando.
Uma outra classificação possível apresentada pela autora é a nostalgia programada. Segundo ela, hoje, o acúmulo de imagens, textos, sons e arquivos do passado amplificam e desencadeiam a nostalgia e isso é usado por instituições de mídia que aproveitam esse potencial nostálgico de seu próprio passado. Sendo assim, a nostalgia programada é a criação estratégica de determinados produtos midiáticos que provocarão um sentimento nostálgico em quem lê, assiste ou interage com ele. Um bom exemplo são os videogames, os remakes e reprises de séries e filmes. Deve-se ainda ressaltar que a nostalgia não é algo automático em cada ser humano. Muito pelo contrário, ela depende de diversos fatores, desde a história de cada indivíduo, até seus gostos pessoais, coisas que fazia na sua infância e adolescência, entre outros. Isso também é percebido quando se compara a nostalgia analógica com a nostalgia digital:
As duas nostalgias apresentam em comum o envolvimento emocional e, em ambos os casos, a contração e a passagem do tempo permitem o surgimento de um contraste com o passado. A nostalgia é sobre objetos analógicos e digitais, sua função e construção tecnológica, seus conteúdos e formas, e os rituais sociais e narrativas pessoais e histórias associadas a eles. Obviamente, uma câmera Polaroid pode conter materialmente traços de tempo, enquanto um GIF animado não envelhece da mesma maneira. É com uma distância temporal que um desenho parece “antigo”, como é também o caso de certas formas e estilos estéticos em geral. Ao contrário de objetos retrô, que reproduzem um desenho no presente não feito no passado, os objetos vintage analógicos transportam e mostram a passagem do tempo entre eles; eles são uma espécie de “ruína” que viaja (NIEMEYER, 2018, p.38).

Por fim, a autora conclui dizendo que acredita que a ideia da nostalgia como prática comunicativa é inegável, bem como sua relação intrínseca e histórica com os textos midiáticos. A autora finaliza dizendo que agora, mais do que nunca, tudo isso fica mais evidente graças às pesquisas que foram feitas internacionalmente nos últimos anos.
